O poder do NÃO
Todos nós em algum momento na vida já ouvimos aquele Não com gostão amargo, aquele em que a letra “N” ecoa em alto e bom tom.
A minha história tem muitos NÃO pelo caminho, e desde a infância a negativa era um instrumento de comunicação muito presente, primeiro porque as condições simplesmente não favoreciam, e segundo porque a minha avó não tinha problema nenhum em dizer NÃO.
E por mais incrível que pareça, eu não precisei fazer terapias por conta disso, aliás lidar com o não sempre foi, de alguma forma, mais natural do que o sim, e também não crio remorsos quando preciso falar para os meus filhos.
Como pais, certamente sempre queremos e buscamos o que é melhor para os filhos, trabalhamos por eles, ficamos acordados até mais tarde por eles, damos as vezes o que não temos para eles, mas vezes precisamos e devemos falar NÃO para eles. E isso não se resume a apenas a relação de respeito, mas também para a formação do caráter deles.
Saber ouvir NÃO e aprender a contornar com competência as adversidades da vida, requer musculatura emocional, e não é possível adquirir tal recurso sem conviver com o fato de que nem tudo se resume ao que queremos.
Estamos vivendo uma era de imbecilidade, a tolerância com as opiniões se polariza e ganha potência, sobretudo no mundo virtual, onde geralmente não existe o elemento NÃO, nesse mundo criamos projetamos aquilo que queremos ser sem precisar lidar com os percalços da vida – todo mundo é bonito, todo casamento é feliz e os filhos são como troféus.
Claro que essa projeção da perfeição é uma ilusão, a vida real requer um pouco mais de decepções, tretas e algumas derrotas. Toda escolha tem seus erros e acertos, e se não soubermos lidar e conviver com os NÃO, sucumbimos na primeira decepção.
Ensinar que o NÃO é parte da convivência e de qualquer jornada é a nossa obrigação enquanto pais, não se cria filhos fortes sem mostrar o lado real da vida, é isso não tem haver com desamor, muito pelo contrário, o amor requer dar ao outro o direto de errar, é dar ao outro a liberdade para fazer suas escolhas, e sim, ao mesmo tempo estabelecer os limites da relação.
É nosso papel ensinar que o NÃO, não é pessoal e muito menos para a vida toda, e que todo SIM precisa ser merecido e conquistado. O problema de uma geração frágil é justamente atribuir as negativas da vida a esfera pessoal, ou seja, tomar o NÃO como pessoal, e não como condição do estado atual, essa é uma das principais razões para todo esse “mimimi” que vemos nas relações organizacionais – as pessoas se doem quando recebem um feedback negativo; pessoais – divergir de opinião com uma pessoa frágil é como se tornar o pior inimigo dela; na família – os mimados invertem a ordem hierárquica, os filhos mandam e desmandam nos pais. Esse último ocorre porque muitos pais querem “compensar” o desafeto que tiveram na infância e cometem o equivoco de que tudo precisa ser criado para facilitar a vida do filho, não criam condições para que eles sejam protagonistas e encurtam qualquer possibilidade de atrito para evitar que os filhos se deparem com a frustração. É tão sério isso, que estamos criando uma geração de mimados e pessoas incapazes de suportar a adversidade, de se posicionarem diante do obstáculo, além do fato de que essas pessoas não são treinadas a esperar, a cultivar e até mesmo a olhar para o outro.
O NÃO deve ser um instrumento de educação, no sentido de desenvolver o espírito de inquietação e busca, e por mais amargo que ele possa parecer, não podemos deixar que seja parâmetro das nossas escolhas, ouvir e aprender com as incontáveis negativas que receberemos ao longo da vida é um exercício mental de resiliência e uma virtude de inteligência.
E vale sempre lembrar que os filhos são mimimis quando os pais são frouxos, não dá para fugir dessa responsabilidade enquanto educadores de uma nova geração.